A dança afro, tal qual foi sistematizada por Mercedes Baptista, se constitui por influências diversas. Tendo sido bailarina de formação essencialmente clássica, levou para a sua dança alguns dos preceitos do balé clássico, mas sobretudo, o conhecimento adquirido sobre dança moderna e a influência das danças de matrizes africanas, com as quais teve contato inicialmente durante o período em que estudou dança moderna com Katherine Dunham, em Nova York.
Katherine Dunham foi uma pesquisadora norte americana que trabalhou com a dança de matriz africana no Caribe e no Haiti aliada à dança moderna e que convidou Mercedes Baptista, então bailarina do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, a estudar dança junto a sua companhia.
Mercedes passou um ano e meio nos EUA estudando dança e retornou ao Rio de Janeiro em 1951 com toda a bagagem artística e cultural adquirida com Katherine Dunham. Há época, o palco do Theatro Municipal ainda não era o mais receptivo para uma bailarina negra e ela então começa a pesquisar, com a ajuda fundamental de figuras religiosas como Joãozinho da Golméia, Paulo Conceição, Gilberto de Jesus, Fu-Manchu e Humberto, a religião africana no Brasil e como ela se dava em termos de dança. Mercedes havia experienciado, a partir das pesquisas de Katherine Dunham, a dança de matriz africana que se dançava no Haiti e no Caribe e que percebeu, não funcionaria aqui (MELGAÇO, 2007, 39-41).
As manifestações afro na dança surgem dentro de um contexto maior, o contexto de um projeto nacional para a cultura brasileira, iniciado com o governo Vargas e que visava a valorização do que poderia ser genuinamente nosso, algo, ou algumas coisas, dentre elas a dança, que nos unificassem como nação (PEREIRA, 2003). A dança afro levada para a cena, com corpos negros e uma técnica que deu à dança de matriz africana um lugar no palco, aparece então com o sentido de reafirmar a cultura afro-brasileira, nacional portanto, na cena artística nacional e internacional através da dança. O popular e o folclórico ganharam espaço cênico a partir das décadas de 30 e 40 e a dança afro como foi sistematizada por Mercedes Baptista veio a legitimar, mesmo que posteriormente ao governo Vargas, essas iniciativas de representar com dança e através dela o que seria realmente nacional.
“A dança afro incorpora a dança dos orixás sem o caráter ritualístico ou litúrgico dos candomblés, adaptada para o palco a partir do terreiro. Nesse processo mudam-se os objetivos: a dança não é mais instrumento para se atingir o transe religioso o que torna os movimentos repetitivos ao som dos atabaques. A coreografia constrói uma grande variedade de movimentos corporais em rápida sequência procurando ocupar todos os espaços do palco. A mesma lógica se aplica à dança do maracatu, lundu, jongo, cafezal, caxambu, que também fazem parte da base coreográfica da dança afro.” (LIMA,1995).
arte do Corpo | Dança Clássica | Dança Afro-brasileira |
Tronco | Bailarino clássico apresenta uma rigidez vertical do corpo, que limita os movimentos dos quadris. | Bailarino afro em posição vertical ou inclinada, realizando frequentes ondulações e intenso movimento de quadris. |
Pernas | Bailarino clássico com pernas extremamente esticadas, projetando o corpo para cima. | Bailarino afro com pernas dobradas, que levam o corpo a se voltar para o chão, sendo este referência determinante. |
Pés | Bailarino clássico em ponta, meia-ponta e/ou na posição en dehors (pés voltados para a lateral). | Bailarino afro com as plantas dos pés voltadas para o chão, em posição paralela. |
Ombros | Bailarino clássico com ombros rígidos, eretos. | Bailarino afro com ombros flexíveis e em intensos movimentos giratórios. |